Só um alienado não percebe o risco que paira sobre o grande oeste catarinense. A cada ano, as agroindústrias locais – verdadeiros motores do desenvolvimento regional – são obrigadas a buscar 6 milhões de toneladas de milho no Brasil central para manter suas gigantescas cadeias produtivas de aves e suínos. Essa operação logística, quase toda rodoviária, representa mais de 150 mil viagens de caminhões em um percurso de 2.200 quilômetros, com custos que superam bilhões de reais anuais. Um fardo que ameaça a competitividade, a sustentabilidade e até a permanência dessas indústrias em solo barriga-verde.
Enquanto o Brasil insiste em ser refém do rodoviarismo, o mundo desenvolvido mostra o caminho: a multimodalidade. Lá, o transporte rodoviário é utilizado para trajetos de até 500 quilômetros; para distâncias maiores, prevalece o ferroviário. A diferença de custos entre os dois modais chega a 50%. Em Santa Catarina, o quadro atual é ainda mais dramático. Rodovias sobrecarregadas agravam o custo logístico e, na ponta, reduzem margens, desestimulam investimentos e ameaçam empregos.
É preciso coragem para romper esse ciclo vicioso. Por isso, a decisão do governador Jorginho Mello de articular lideranças dos quatro Estados – Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul – em favor da Ferrovia Norte-Sul (Ferrosul) merece aplausos. A iniciativa é estratégica e visionária. Trata-se de um projeto capaz de ligar polos de produção e consumo, assegurando o abastecimento do imenso parque agroindustrial do oeste catarinense com milho e soja, ao mesmo tempo em que escoa alimentos industrializados para grandes centros urbanos e portos.
Não se trata de um capricho regional, mas de uma necessidade nacional. O agronegócio brasileiro, responsável por cerca de 25% do PIB, não pode ficar à mercê de uma matriz logística arcaica. A ausência de ferrovias não só eleva os custos em 40% como também retira a competitividade das empresas do oeste catarinense, forçando algumas a migrarem para o centro-oeste.
A Ferrovia Norte-Sul é a resposta. Com ela, o transporte de milho, soja, farelo, fertilizantes e calcário será mais barato, mais ágil e mais sustentável. A agroindústria catarinense deixará de temer o avanço da fronteira agrícola para o centro-oeste, preservando a pujança de suas cooperativas e empresas. Além disso, a ferrovia representará uma revolução ambiental, com redução significativa de emissões de CO₂ e menor desgaste das rodovias.
O Brasil precisa, urgentemente, repensar sua matriz de transporte. Países com grandes extensões territoriais, como Estados Unidos e China, já fizeram isso há décadas, priorizando as ferrovias e hidrovias. Aqui, seguimos presos a um modelo rodoviário que, além de caro, é insustentável a longo prazo.
Por outro lado, a “Ferrovia do Frango”, como foi apelidada a ligação do oeste catarinense aos portos, é outra frente essencial. Aqui também tem a mão do Governo do Estado que contratou o projeto do trecho Lages-Chapecó. Custos elevados de transporte até o litoral significam redução de ganhos ou até perda de mercados no exterior. Com a ferrovia, os alimentos produzidos no oeste chegariam aos portos a custos até 5% menores, aumentando a competitividade e abrindo novas oportunidades de negócios.
Transporte ágil e barato é fator de atração de investimentos. É fator de desenvolvimento regional. É garantia de que o oeste catarinense continuará a ser referência em produção de alimentos para o Brasil e o mundo.
O governador Jorginho Mello acerta ao levantar essa bandeira. Cabe agora às lideranças políticas, empresariais e cooperativistas dos quatro Estados transformar essa visão em realidade. A Ferrovia Norte-Sul não é apenas possível. É necessária. É estratégica. É uma questão de sobrevivência para a agroindústria catarinense e para a segurança alimentar do País.
O futuro nos cobra ação. E ele começa com trilhos.