O surgimento dessas cepas causou quadros com severas mortalidades em granjas de frango e poedeiras, e em um primeiro momento o controle dessa situação foi muito limitado, pois não estavam disponíveis no Brasil as cepas vacinais conhecidas como “fortes” ou “intermediárias plus”, ou seja, vacinas desenvolvidas com vírus mais invasivos que àqueles usados até o momento (“intermediárias”), que conseguiam superar níveis de anticorpos maternais (ACMs) mais elevados e, por consequência, colonizar a bolsa mais precocemente, impedindo a entrada e replicação do vírus de campo.
Desde então, o controle da enfermidade está sendo, aparentemente efetivo, e nos últimos 15 anos novas vacinas se tornaram disponíveis com a proposta de prevenir a Doença de Gumboro e evitar prejuízos, além de oferecer a conveniência de não precisar vacinar no campo. Todavia, este cenário recente de aparente tranquilidade com o controle de Gumboro novos desafios apareceram e deixamos de nos preocupar com essa enfermidade causadora de enormes prejuízos.
Tempos modernos: A eficiência é o único caminho! A avicultura industrial demanda trabalharmos com a máxima eficiência em todas as atividades relacionadas à produção. No cenário atual, com a elevada pressão nos custos da matéria-prima, precisamos garantir sucesso em cada elo da nossa cadeia produtiva, garantindo o melhor aproveitamento dos recursos disponíveis, e traduzindo isso na maior produtividade possível.
A única forma de assegurar o melhor aproveitamento do potencial genético das linhagens atuais se dá pelo desenvolvimento inicial seguro das aves, sem que precisem combater patógenos ou qualquer fator imunossupressor. Por isso o controle da Doença de Gumboro se torna o alicerce capaz de permitir o desenvolvimento de um lote saudável e que tenha condições de atingir sua máxima produtividade.
As fases iniciais do alojamento das poedeiras são o alicerce para a construção de uma vida produtiva longa, saudável e eficiente. Dentro dessa lógica, qualquer atraso no desenvolvimento das aves causado por quadros subclínicos de Gumboro e que normalmente têm como grande reflexo a desuniformidade dos lotes, pode significar prejuízos significativos na vida produtiva das aves.
O custo da DIB foi muito bem descrito em diferentes publicações ao longo dos últimos anos. Isto representa um impacto direto na mortalidade, de 5% a 30%, dependendo do grau de proteção das aves e da forma da doença. Além disso, os prejuízos podem ser ainda maiores quando consideramos os impactos na produtividade de lotes com desenvolvimento desuniformes e, consequentemente, imunossuprimidos.
É necessário construir a produtividade dos lotes, sob um forte alicerce de sanidade. Suportado por eficientes programas vacinais, e no caso da Doença de Gumboro, programas que interrompam o ciclo da doença.
A Doença de Gumboro está sob controle? Nos últimos anos, não têm sido comuns relatos de quadros clínicos da enfermidade. Porém, em diferentes regiões do país é bastante comum situação de doenças recorrentes ou mesmo falhas em programas vacinais, sem que se consiga identificar causas primárias. E coincidentemente, nessas mesmas situações, percebe-se que não existe uma preocupação específica para o controle da Doença de Gumboro. Nem com a vacinação e monitoria.
Essa condição, têm contribuído para o aparecimento de uma série de quadros subclínicos da enfermidade que têm como características principais a desuniformidade inicial dos lotes, atraso no desenvolvimento, recorrência de enfermidades respiratórias, entéricas e o consequente impacto negativo no potencial produtivo dos lotes.
Assim, hoje, consideramos fundamental um adequado programa de monitoria de Gumboro para termos uma ideia clara da situação atual do desafio e da eficiência das estratégias de controle.
Como identificar se o vírus de Gumboro está “roubando” resultados?
Na avicultura moderna, com as vacinas disponíveis, foi possível estabelecer estratégias de vacinação que previnem o aparecimento de quadros clínicos da doença, com mortalidades e hemorragias aparentes. Por isso, nossa avaliação deve começar sempre considerando os resultados zootécnicos e desenvolvimento inicial dos lotes. Muitos avicultores consideram que o principal impacto da Doença de Gumboro é o atraso no desenvolvimento, e consequente desuniformidade das aves em fase de cria e recria. Quadros onde os lotes frequentemente não atingem os pesos considerados ideais, ou que conseguem atingir, com uniformidades baixas, podem significar uma luz amarela, demandando atenção para a possível presença do vírus de Gumboro.
A monitoria de campo pode ser uma forma eficiente e simples de avaliar o possível impacto do vírus de Gumboro nas criações de poedeiras comerciais. Uma vez que os vírus de campo têm diferentes efeitos patológicos na Bursa de Fabricius, que podem ser medidos de forma indireta pelo nível de atrofia causada no órgão. E portanto, a frequente monitoria de campo, avaliando a morfologia da bolsa, pode ser uma ferramenta prática, simples e eficiente para identificar a possível presença de desafio de campo que esteja acometendo as aves.
Assim como os vírus de campo, as diferentes vacinas disponíveis têm diferentes efeitos na morfologia da bolsa e a monitoria do órgão serve também de maneira prática para avaliar a eficiência do programa vacinal. Um bom programa vacinal, deve assegurar a colonização da bolsa de forma precoce, o que vai depender diretamente do nível de anticorpos maternais das pintainhas. Essa pega vacinal assegura a interrupção do ciclo de Gumboro na granja, pois impede a colonização da bolsa por vírus de campo, reduzindo assim o desafio ambiental. Vale destacar que até o momento ainda não há vacina viva para administração no incubatório desenvolvida especificamente para poedeiras. Assim, as vacinas vivas disponíveis (únicas que colonizam a bolsa) são normalmente administradas via água. Como esse procedimento muitas vezes têm sua eficiência comprometida por diferentes fatores (volume e qualidade da água, tempo de consumo, anticorpos maternais, etc.), faz-se necessário a elaboração de programas com repetidas aplicações, aumentado os custos e manejo, sem a certeza de eficiência.
Outras vacinas, que não possuem um vírus vacinal de Gumboro (recombinantes que usam como vetor o vírus de Marek HVT-Gumboro) podem ser administradas no incubatório, porém, não terão efeito nenhum direto na bolsa. Essas vacinas estimulam resposta imune das aves, mas não têm capacidade de colonizar a bolsa, e portanto não param o ciclo de Gumboro e não reduzem o desafio de campo.
Qual a melhor estratégia para o controle da Doença de Gumboro? O nível do desafio de campo e a eficiência do programa vacinal serão determinantes para o desenvolvimento inicial dos lotes. E qualquer atraso de desenvolvimento nesse período, frequentemente, representam prejuízos produtivos.
Nesse cenário, precisamos retomar os cuidados básicos lembrando sempre do enorme impacto histórico da Gumboro no Brasil. O fato de não termos mais quadros clássicos não significa que a enfermidade não tem causado significativos prejuízos através de quadros subclínicos que podem estar ocorrendo por todo o país.
Assim, a melhor estratégia para a prevenção é a escolha de um programa vacinal que tenha a capacidade de parar o ciclo de Gumboro, reduzindo assim inclusive o desafio de campo. É fundamental conhecermos o comportamento do agente e a epidemiologia da enfermidade para eleger vacinas que além de estimular a imunidade das aves, tenham a capacidade de colonizar a Bursa de Fabricio de 100% das aves, interrompendo assim a proliferação do desafio de campo.
Um ponto de atenção é a dificuldade de assegurar a adequada vacinação contra Gumboro em lotes de poedeiras. Devido a grande variação dos níveis de Anticorpos Maternais (ACM) contra Gumboro se faz necessário a administração de vacinas em grande quantidade, algumas vacinando os lotes semanalmente, até às 5 ou 6 semanas de idade (vide arte ACM).
As aves de postura, têm uma curva de queda dos ACM mais lenta que das aves de corte. Dessa forma, é fundamental a escolha de uma vacina adequada a cada segmento da avicultura.
Um programa efetivo de prevenção da Doença de Gumboro deve:
• Assegurar uma proteção contínua das frangas contra a infecção a nível da granja: Parar o ciclo de Gumboro na área.
• Prevenir ou reduzir significativamente a quantidade de vírus espalhado no ambiente: Redução de disseminação do ciclo de Gumboro na área.
• Colonizar a Bursa de Fabricius de 100% das aves. Mesmo com grande variabilidade dos níveis de ACM.
• Evitar o efeito elevador: Quando a carga viral aumenta ciclo após ciclo.
• Parar o ciclo de Gumboro de forma que o vírus de campo não sobreviva ao programa de prevenção.
Esses pilares garantem a redução da disseminação do agente de campo, evitando qualquer potencial prejuízo que a doença possa causar.
Conclusão. Há alguns anos a avicultura nacional não enfrenta com grande frequência surtos de doença clínica de Gumboro em lotes de frangos ou poedeiras. E essa situação, de aparente tranquilidade, favorece a flexibilização dos programas de monitorias de campo por considerarmos que não temos evidências claras de quadros infecciosos. Contudo, um dos sinais de alerta e que muitas vezes é ignorado é a queda da uniformidade média dos lotes e o consequente atraso no desenvolvimento. Esse atraso inicial, muitas vezes pode estar relacionado a quadros subclínicos da doença, e que são confundidos com outras causas ambientais, nutricionais ou infecciosas, pois as aves não apresentam nenhum sinal clínico aparente, os lotes não têm as bursas monitoradas.
Adicionalmente, a escolha da vacina de Gumboro para postura comercial deve ser feita baseada em conceitos técnicos claros e rígidos, considerando fatores como facilidade de aplicação, conveniência de associação com outras vacinas, ser desenvolvida especificamente para poedeiras e, principalmente, ter a capacidade de parar o Ciclo de Gumboro.
*Felipe Pelicioni é médico-veterinário formando pela Universidade Estadual Paulista, pós-graduação em Marketing pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e ocupa a posição de Gerente de Marketing Aves de Ciclo Longo da multinacional francesa Ceva Saúde Animal.