Problemas respiratórios sempre foram responsáveis por consistentes prejuízos econômicos à indústria avícola, porém provavelmente representam atualmente o maior desafio sanitário da atividade, persistindo no frio e no calor, no período de seca ou de chuvas, com bom manejo de cama e até quando tudo parece normal. Mas como pode um agente infecioso se adaptar a tantas condições diversas e ser resistente a vários fatores?
Esta é a pergunta de muitos milhões de dólares. O fato é que esses problemas respiratórios têm causas variadas, infecciosas ou não, e muitas vezes ocorrem simultaneamente. O que chamamos de “doença”, na verdade se trata de uma “síndrome”. A diferença está no fato de que a enfermidade tem causa definida, enquanto as síndromes podem ocorrer por motivos variados. Tudo isso torna ainda mais complexos o diagnóstico, a prevenção e até mesmo o tratamento.
Dentre os agentes infecciosos envolvidos no conjunto de sintomas respiratórios, alguns são críticos, com notificação obrigatória aos órgãos sanitários, os quais devem ser monitorados bem de perto. Esse é o caso do vírus da Doença de Newcastle, da Influenza Aviária e da Laringotraqueíte, além de outros que já fazem parte do cotidiano da avicultura, mas que ainda assim costumam ocorrer com frequência – caso do Vírus da Bronquite Infecciosa. O IBV, como é conhecido na sigla em inglês, talvez seja o integrante comum da maioria dos quadros respiratórios em aves.
O IBV é membro da família gama-coronavírus e está entre os patógenos mais importantes da avicultura, causando, além de doenças respiratórias, quadros de nefrite em galinhas, o que provoca menor ganho de peso, redução da produção de ovos, deformidades da casca do ovo e aumento nas taxas de mortalidade, levando a perdas econômicas significativas. O vírus é caracterizado por alta variabilidade genética, sorotípica e patotípica, e ocorre de forma endêmica no Brasil.
Ainda mais grave: o IBV tem grande potencial para mutações genéticas e possui diferentes variantes ao redor do mundo. Essas cepas podem ser cosmopolitas, como é o caso da “Massachussetts”, ou ocorrer em locais isolados, a exemplo da cepa brasileira “BR”. Estas características dificultam o diagnóstico da bronquite como causa primária, quando os sintomas são agravados por outros componentes da síndrome respiratória.
O cenário se tornou ainda mais desafiador com o aparecimento de uma nova variante – a 2 (VAR2). Em outros países onde esta variante ocorre, verificou-se que as cepas de vacinas não homólogas (como 4/91, CR88 e Massachusetts) eram incapazes de fornecer proteção razoável e a variante continuou a se espalhar, independentemente do programa de vacinação adotado ou das vacinas usadas.
A combinação de diferentes tipos de cepas na composição de vacinas tem apresentado resultados variados. A soma de cepas Massachussetts, QX e 793B mostra baixa imunidade cruzada entre essas vacinas e a VAR2. Outras pesquisas de eficácia utilizando as cepas Massachusetts e QX-like indicam proteção parcial de até 85%. Estudo utilizando as cepas Massachusetts, 793B, QX e IBVAR206, contudo, demonstraram que uma única dose vacinal é capaz de induzir proteção de 100% frente ao desafio.
O surgimento de uma nova variante, ou mesmo a ocorrência de uma variante exótica, exige trabalho árduo de acompanhamento clínico e sanitário das aves, aplicando técnicas de diagnóstico para encontrar causas, muitas vezes inesperadas. Mas o que fazer até encontrar a causa principal em um cenário em que, muitas vezes, essa causa principal não é encontrada?
Nesse momento, devemos focar em eliminar prováveis razões ou agravantes. Isso inclui revisitar técnicas de manejo, processos e programas de vacinação e doenças intercorrentes – principalmente as imunossupressoras, como Reovirose, Anemia Infecciosa ou mesmo Doença de Gumboro, que costuma atuar como “gatilho” em muitos casos de síndromes respiratórias. Atualmente, a forma subclínica desta doença, causada pela cepa G15, está disseminada em todo o país, sendo frequentemente isolada, inclusive em aves jovens a partir dos 18 dias de idade. A variante consegue se manter por longos períodos na cama do aviário, muitas vezes resistindo ao tratamento e passando de um lote para outro. Esta cepa tem alto poder de colonizar a Bursa de Fabricius, órgão linfático, e se aproveita do período de janela imunológica para infectar os lotes.
As infecções secundárias, principalmente devido à Escherichia coli, representam a principal causa do uso de antimicrobianos nesses casos. Porém, o uso indiscriminado de tais recursos fez surgir uma população de bactérias multirresistentes, o que interfere na eficácia dos tratamentos. Assim, os tratamentos devem ser feitos criteriosamente, com base no perfil de resistência da bactéria isolada na granja, sempre como moderação e atendendo à recomendação de dose, tempo de tratamento e via de administração de cada medicamento.
Nos casos das síndromes, tão importante quanto achar a causa principal, é se certificar de que outros agravantes sejam eliminados e garantir será feito o melhor possível com as condições e os recursos disponíveis, pois muitas intercorrências comuns, que isoladamente não causariam problemas, se tornam gigantes quando ocorrem simultaneamente. Todo quadro de síndrome respiratória, independentemente da causa primária, costuma estar associado a fatores imunossupressores (como Doença de Gumboro e Micotoxinas) e infecções secundárias, muitas vezes com E. coli patogênica multirresistente.
É certo que a vacina oferece a melhor proteção nos casos de bronquite infecciosa. Contudo, outros cuidados devem ser observados no manejo, na atenção aos processos de vacinação e no combate aos agentes imunossupressores.