O Rabobank, banco de atuação global especializado em soluções financeiras e estratégicas para o agronegócio, divulgou o relatório Perspectivas para o Agronegócio 2024, que traz as principais projeções para o setor. De acordo com o estudo, 2023 foi bastante movimentado e, com isso, o aumento da atenção sobre fatores como mudanças climáticas, problemas logísticos, impactos políticos e os rumos da economia para o próximo ano.
No contexto macroeconômico, o avanço na aprovação de reformas estruturais permite que a inflação continue a perder tração em relação a 2022, mas as incertezas globais e os riscos geopolíticos limitam cortes mais profundos dos juros. O economista-chefe do banco para a América do Sul, Maurício Une, avalia que os cortes de juros deste ano ainda levarão mais tempo para serem sentidos na ponta final e, assim, a política monetária ainda seguirá restritiva por mais algum tempo. Ou seja, depois da surpresa positiva da extraordinária safra deste ano, o crescimento do PIB ainda continuará a perder impulso. Desta forma, o agro precisará estar atento às contas! O ano que vem demanda cautela, mesmo que tenha perspectivas positivas.
Margens acendem alerta, mas preços de fertilizantes animam
Com os preços das commodities vivendo um ciclo de alta, o mercado agrícola brasileiro aproveitou boas margens para os produtores rurais, mas com a desaceleração a partir da metade deste ano, o próximo período preocupa com as baixas margens dos produtores. Isso traz a necessidade de recalcular a rota. Por outro lado, valores praticados no mercado brasileiro começaram a cair no segundo semestre do ano passado. Com isso, o custo de produção diminuiu, e deve se acomodar nesses patamares mais baixos no ano que vem.
Para 2024, as projeções do Rabobank apontam uma retomada nas entregas de fertilizantes, com projeção indicando um volume final das entregas entre 43 e 46 milhões de toneladas. O banco projeta um grande crescimento no mercado de biológicos em 2024, com uma performance de vendas melhor do que os defensivos químicos. “Devemos esperar uma retração nos custos operacionais das principais culturas do país, em especial os relacionados à adubação. Já algodão, café, cana-de-açúcar, citrus, milho e soja, devem apresentar, na média, uma retração de aproximadamente 36% nos custos de adubação em relação à safra passada”, afirma o analista de Insumos do banco, Bruno Fonseca.
A nova safra deve ser, de novo, altamente açucareira
Após a recuperação da produtividade nos canaviais do centro-sul em 2023/24, a expectativa é de mais uma grande safra, de 610 milhões de toneladas de açúcar na região para 2024/25. A produção deste ano permitiu que os produtores combinassem um alto volume de produção com ótimos preços de mercado. Apesar da safra grande no Brasil, a expectativa de produção e exportação menor da Índia e da Tailândia em 2023/24 tem sustentado os preços internacionais em níveis altos desde meados de 2023, e dúvidas a respeito do escopo para estes países se recuperarem em 2024 poderiam manter os preços internacionais estáveis ao longo do próximo ano.
Se a perspectiva para o preço do açúcar é um motivo para comemorar, para o etanol é outra história. Para 2024, o estrategista global do Rabobank para o setor, Andy Duff, avalia que a chance de o açúcar continuar muito lucrativo em comparação ao etanol é alta, e enquanto o preço do açúcar estiver compensando os preços baixos do etanol, as empresas devem começar o próximo ciclo com as finanças positivas.
Apesar dos desafios, aumento na oferta deve trazer alívio ao mercado
Considerando a colheita de 2023 e uma boa safra em 2024, as exportações brasileiras de café devem crescer nos próximos meses. A escassez do produto manteve os preços valorizados durante a maior parte do ano para o café arábica e para o robusta, mas a partir do segundo semestre os rumos foram mudando, principalmente por conta das perspectivas de produção. Embora se projete um aumento de 6% na oferta global, atingindo 174,2 milhões de sacas (60 kg), estima-se que a produção de robusta diminuirá 1%, enquanto o arábica crescerá 12%.
As exportações brasileiras de café também estão se recuperando, e o analista de Café do Rabobank, Guilherme Morya, projeta exportações entre 40 e 42 milhões de sacas em 2023/24 (jun-jul). Entre janeiro e outubro de 2023, o Brasil embarcou 30,6 milhões de sacas, 5,5% a menos que o mesmo período do ano anterior. Apesar das exportações abaixo das expectativas, é esperado um aumento nos próximos meses devido à boa colheita de 2023. Ainda assim, é importante ressaltar que o fenômeno climático El Niño continua gerando preocupações, especialmente devido à sua possível influência negativa nas safras de 2024/25 na Ásia, América Central, Colômbia e nas colheitas de café robusta no Brasil. Essa eventualidade poderia reverter a tendência de pressão nos preços do café ao longo de 2024.
Baixa previsibilidade de fatores externos trazem incertezas para a proteína animal
As questões climáticas ligadas ao El Niño devem também ser um fator de atenção para o mercado de proteína animal no primeiro trimestre, principalmente por conta das previsões de volumes de chuva acima da média na região Sul e Sudeste, que concentram cerca de 27% do rebanho bovino. O fenômeno também pode afetar as cotações da ração, bem como impactar negativamente a entrega de animais para abate e a chegada de insumos para produção. Além disso, fatores geopolíticos, riscos sanitários e o poder de compra da população são outras questões que devem continuar desafiando o setor.
O Rabobank projeta novo aumento recorde de 1% a 2% na produção de carne bovina em 2024, guiados pelo mercado internacional, expectativas de aumento nas importações chinesas e a retomada do consumo no Brasil, que deve registrar melhora de 0,5% a 1,5%. Para a carne suína, o ritmo de crescimento da produção global deve ser interrompido. Com as expectativas de preços competitivos no mercado externo e aumento na demanda chinesa, um dos principais desafios deve ser no mercado doméstico, ainda que este ano a demanda local de carne suína tenha melhorado com o consumo de produtos processados e embutidos, o impacto da inflação dos alimentos deve continuar pesando menos no consumo local.
A oferta da carne bovina deve continuar desafiando a competitividade da carne suína, não somente pela menor diferença de preços, mas pelo apelo cultural para boa parte da população. O analista de Proteína Animal do Rabobank, Wagner Yanaguizawa, projeta um novo incremento de 3% a 4% na oferta de carne suína em 2024. O frango, por sua vez, promete mais um ano de oferta e demanda em expansão com a competitividade brasileira em termos de preço, somado ao potencial de manter os níveis de exportação. A tendência de crescimento na oferta global deve se consolidar, e o principal desafio deve estar ligado a questões sanitárias como a Influenza Aviária, por conta da baixa previsibilidade.
Influência da oferta global traz esperança modesta para alguns setores
A recuperação dos preços internacionais do leite iniciou no quarto trimestre de 2023. O preço ao produtor deve melhorar com importações menores, demanda mais consistente e a oferta internacional perdendo dinamismo. No entanto, isso incentiva o aumento de compras estratégicas de grandes importadores nos mercados emergentes. No Brasil, preços internacionais maiores devem reduzir a competitividade do leite importado, mas o câmbio, o preço interno e a presença do Mercosul em outras regiões serão determinantes para o nível de importações. “Com margens levemente melhores no campo e importações menores, a oferta deve avançar moderadamente no primeiro semestre, com um crescimento de 2% em volume para o ano todo”, afirma o especialista do banco, Andres Padilla.
A influência da oferta global também impacta o setor de suco de laranja, que está trabalhando sem estoques e preços recorde por problemas de oferta no Brasil mas também em outras regiões produtoras. Para o produtor de laranja, os preços da fruta têm sido os maiores já registrados. A demanda por suco de laranja deve cair significativamente na Europa e nos EUA e ajudar a equilibrar o mercado lentamente, mas os preços do suco e da fruta devem se manter em patamares elevados por pelo menos mais um ano.
A estabilidade após recordes consecutivos
Em tempos onde a soja foi destaque no agronegócio nacional, com preços e margens recordes entre 2020 e 2022, a estimativa é que 2024 seja marcado por uma redução das margens e um aumento da área plantada menor que nos últimos três anos. A oferta histórica e a escassa infraestrutura para armazenar, carregar e exportar o grão fizeram com que os prêmios voltassem a atingir patamares negativos, o que não ocorria desde 2014. Os principais componentes da precificação tiveram uma redução significativa, causando uma queda acumulada de 27% nos preços. Com isso, a soja brasileira se tornou mais competitiva no âmbito internacional e alcançou a impressionante marca de 156 milhões de toneladas em 2023. A especialista do Rabobank, Marcela Marini, estima um aumento da área de 2,5% para a próxima safra, que resultará em 163 milhões de toneladas.
Para o milho, a executiva projeta uma produção de 127 milhões de toneladas no Brasil, com margens mais atrativas em relação a outras culturas que levarão o produtor rural a uma redução da área de milho safrinha. O ciclo passado alcançou um volume recorde de produção, de modo que o excesso de oferta, a escassez de armazenagem e o atraso na comercialização pressionaram os preços no mercado local. “É esperado que as exportações sofram uma redução e alcancem 48 milhões de toneladas em 2024. Considerando esse cenário, os estoques de milho deverão apresentar uma estabilidade em relação aos níveis de 2022/23. No âmbito global, uma recomposição global dos estoques, principalmente dos Estados Unidos, indicam preços menores para a próxima safra”, completa Marcela.
Demanda de algodão é incerta para o médio prazo
Assim como outras commodities, para o algodão, fatores como clima e economia global também tendem a ser determinantes nos próximos meses. Na Bahia, o plantio deverá iniciar a partir de novembro, no entanto, um atraso nas chuvas do Mato Grosso tem adiado o plantio da soja e pode impactar o ritmo do plantio na próxima safra. Por outro lado, o efeito negativo do cenário macroeconômico reforçou a vulnerabilidade do mercado da pluma e pode impactar o ritmo de recuperação das exportações nos próximos meses. Vale destacar que os preços no mercado brasileiro seguiram a mesma tendência de queda, dado o encerramento da colheita e o avanço do beneficiamento, além disso, uma redução de 25% nos preços em comparação ao ano passado tem preocupado o produtor.
Ainda assim, o Brasil deve fechar 2023 com uma alta 24% maior, atingindo uma produção acima de 3,2 milhões de toneladas, principalmente pelo clima favorável para a cultura do algodão. Para 2023/24, a área plantada deve apresentar o quinto crescimento consecutivo, com mais de 1,8 milhão de hectares. A queda das margens do milho safrinha vai favorecer essa ampliação e, com isso, o Rabobank estima uma safra total de 3 milhões de toneladas, que levará o Brasil para o terceiro lugar no ranking dos maiores produtores mundiais.
Aumento de oferta e queda no consumo de celulose
O cenário no setor de celulose sugere maior disponibilidade de oferta e demanda menos dinâmica. Os preços globais enfrentam desafios para aumentar significativamente em 2024, após atingir os maiores preços dos últimos cinco anos no final de 2022.As companhias globais intensificaram a produção com novos projetos que já vinham sendo construídos nos últimos cinco anos e os preços recuaram no primeiro semestre. Mesmo com atrasos no início das operações das novas fábricas na América do Sul, as novas entradas de capacidade já devem iniciar o ano em um ritmo acelerado de produção, o que pode significar um crescimento de 3 milhões de toneladas. Porém, vale lembrar que a capacidade de alto custo deve continuar saindo do mercado, pelo menos de forma temporária, o que pode ajudar a trazer equilíbrio.
No mercado doméstico brasileiro, o consumo de papelão ondulado deve encerrar 2023 com estabilidade em comparação a 2022, atingindo um volume próximo aos 4 milhões de toneladas pelo terceiro ano consecutivo. A projeção do especialista do Rabobank, Andres Padilla, é que em 2024 o consumo de papelão ondulado se mantenha estável, sem grandes perspectivas de aumento de demanda. No mercado brasileiro de papel, por sua vez, deve encerrar 2023 com leve queda de produção de aproximadamente 1%, com pouco menos de 11 milhões de toneladas.
Para acessar o conteúdo completo, clique aqui.