Novas análises genômicas rastreiam as origens e a disseminação do recombinante EA-2023-DG H5N1, destacando os riscos zoonóticos em evolução e a urgente necessidade de vigilância.
Um novo estudo científico publicado na revista Emerging Infectious Diseases mapeou o surgimento e a disseminação de um novo genótipo altamente patogênico do vírus da gripe aviária A(H5N1) — EA-2023-DG — em toda a Europa. Conduzido por uma equipe internacional de pesquisadores liderada pela Unidade de Virologia e Imunologia Aviária da Sciensano (Bélgica), em colaboração com laboratórios de 13 países, o estudo reconstrói as origens do rearranjo desse vírus e fornece um relato filo geográfico detalhado de sua transmissão entre 2023 e meados de 2024.
Suas descobertas não apenas ressaltam a natureza dinâmica da evolução do vírus da gripe aviária, mas também reforçam a importância crítica da vigilância genômica na antecipação e mitigação de ameaças zoonóticas e agrícolas.
Principal descoberta: Um novo reagrupamento surge na região do Báltico
O genótipo EA-2023-DG foi identificado pela primeira vez em um cisne selvagem na Finlândia em novembro de 2023 e posteriormente detectado em aves domésticas, aves em cativeiro e em uma raposa selvagem em 11 países europeus. A análise genômica revelou que esse genótipo do vírus surgiu por meio de um evento de rearranjo na região sudoeste do Mar Báltico — provavelmente entre julho e agosto de 2023.
Seis dos oito segmentos genéticos do vírus foram herdados do genótipo dominante EA-2021-AB. No entanto, dois segmentos de polimerase (PB2 e PA) originaram-se de vírus da gripe aviária de baixa patogenicidade (LPAI) que circulam na região, evidenciando a mistura genética contínua entre vírus da gripe em populações de aves selvagens.
Distribuição geográfica: da costa alemã a um alcance continental
Após sua detecção inicial, o EA-2023-DG foi relatado na Alemanha, Suécia, Polônia, Bélgica, Inglaterra, França, Noruega, Eslováquia, Suíça, Áustria e Finlândia. A Alemanha relatou o maior número de casos, incluindo 13 granjas avícolas e várias detecções em animais selvagens. O vírus foi encontrado em várias famílias de aves — Phasianidae (galinhas, perus), Anatidae (patos, gansos), Accipitridae (gaviões) e outras — bem como em uma única raposa vermelha selvagem.
Em junho de 2024, o vírus havia se espalhado do Mar Báltico para o sul, até Lyon, na França; a oeste, até a Inglaterra; e a leste, até a Eslováquia. Apesar da ampla dispersão, a circulação central permaneceu concentrada na Alemanha, Suécia e Polônia.
Ferramentas e Métodos: Uma Reconstrução Filodinâmica
Utilizando sequências genômicas completas submetidas ao GISAID, os pesquisadores aplicaram modelagem filogeográfica discreta e contínua para traçar o caminho evolutivo do vírus. Essas abordagens permitiram não apenas identificar o provável momento e o local de surgimento, mas também rastrear sua migração subsequente pelo continente.
O estudo destaca o poder das ferramentas filodinâmicas — que combinam dados do genoma viral com metadados geográficos e temporais — para monitorar a evolução e o movimento do vírus em tempo real, mesmo em meio ao viés de amostragem e à vigilância limitada da vida selvagem em algumas regiões.
Implicações mais amplas: potencial zoonótico e preocupações com a biossegurança
O surgimento do EA-2023-DG é mais do que uma preocupação acadêmica. O vírus já serviu de modelo para experimentos in vivo nos Estados Unidos, avaliando a replicação do vírus H5N1 em bovinos e animais domésticos. Esses estudos mostraram que o vírus pode se replicar eficientemente em tecidos de mamíferos e adquirir mutações adaptativas, como a PB2 E627K — mutações que podem aumentar seu potencial de transmissão entre espécies.
Com casos contínuos de gripe aviária em mamíferos, incluindo gado, gatos e até mesmo humanos, a rápida evolução dos vírus H5N1 do subtipo 2.3.4.4b, como o EA-2023-DG, gera alarme tanto para a saúde pública quanto para a biossegurança agrícola.
A vigilância continua sendo um pilar fundamental da preparação
Embora o estudo ilustre o papel significativo da genômica na compreensão da dinâmica de surtos, ele também expõe lacunas importantes na vigilância entre países — particularmente no monitoramento da vida selvagem. Ainda assim, o uso integrado de dados genéticos, espaciais e temporais oferece um modelo poderoso para investigações futuras.
Dada a contínua evolução e disseminação do vírus H5N1, os autores enfatizam a necessidade de sistemas de vigilância coordenados e de âmbito internacional, que incorporem o sequenciamento completo do genoma e o compartilhamento de dados em tempo real. Tais sistemas são essenciais na obtenção de respostas oportunas em saúde pública e saúde animal, na limitação dos riscos de contágio e na preparação para ameaças emergentes.
Gênese e disseminação de um novo vírus H5N1, recombinado, da Influenza Aviária |
Van Borm S, Ahrens AK, Bachofen C, et al https://wwwnc.cdc.gov/eid/article/31/6/24-1870_article |