Unidades dedicadas à fabricação de imunizantes contra febre aftosa se voltariam também ao combate da covid-19.
Instigado pelo Ministério da Agricultura, o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Saúde Animal (Sindan) colocou à disposição do governo, para a produção de imunizantes contra a covid-19, as quatro unidades instaladas no país dedicadas à fabricação de vacinas contra a febre aftosa – doença que, até a década de 1990, era comum no rebanho bovino brasileiro.
Tanto no caso da aftosa quanto da Coronavac, por exemplo, as vacinas são inativadas, produzidas a partir de vírus morto. Assim, explica Emílio Salani, vicepresidente executivo do Sindan, a tecnologia e os procedimentos envolvidos são similares. Segundo ele, se o sinal verde para a colaboração fosse dado hoje, em cinco meses as fábricas de vacinas contra a febre aftosa já poderiam estar produzindo também vacinas contra a covid-19.
Das quatro unidades aptas a produzir as vacinas que permitem a imunização do rebanho bovino brasileiro – e, com isso, mantêm os mercados internacionais abertos para a carne brasileira -, três estão em operação: a da Ourofino em Ribeirão Preto (SP), a da MSD em Montes Claros (MG) e a da Ceva em Joatuba (MG). A quarta fábrica, situada em Paulínia (SP), pertence atualmente à Boehringer, mas está desativada.
Segundo Salani, das três plantas em operação saíram as 262 milhões de doses de vacinas contra a aftosa aplicadas no rebanho brasileiro no ano passado. A vacinação dos animais é realizada por meio de duas campanhas anuais, em maio e em novembro.
A vacinação ocorrerá na maior parte dos Estados, exceto no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina, Paraná, Rondônia, Acre, parte de Mato Grosso e parte do Amazonas. Santa Catarina já é um Estado que tem status internacional de área livre de aftosa sem vacinação, enquanto os demais estão tentando conquistá-lo.
Nenhum outro país do mundo vacina tantos bovinos há tanto tempo quanto o Brasil, e esse pode ser um trunfo neste momento, segundo Salani. “Nosso parque fabril é biosseguro e validado pelo governo, e a indústria domina a tecnologia. O Sindan pode fazer a ponte entre quem tiver interesse em produzir e as indústrias de saúde animal capacitadas”, afirmou.
Essa colaboração não prejudicaria a produção de vacinas contra aftosa, por causa da sazonalidade e do fato de a capacidade nominal de produção de vacinas contra a aftosa ser de 500 milhões de doses por ano.
Salani conta que já houve reuniões entre o Sindan e o Instituto Butantan sobre essa possível colaboração, mas nenhuma decisão ainda foi tomada nesse sentido. No fim de semana, o senador Wellington Fagundes (Partido Liberal-MT), que é médico veterinário e relator da comissão no Senado da covid-19, acionou a diretoria do Sindan, gostou do que ouviu e levou a proposta para o Congresso.
O senador se reuniu ontem com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, que apoiou a proposta. A interlocução também deverá ser mais fácil com a troca no comando do Ministério da Saúde.
Segundo ele, a autorização para a produção no país não envolve a discussão sobre a quebra de patentes das vacinas, pois acordos internacionais preveem a transferência de tecnologia. Em vez de importar o Insumo Farmacêutico Ativo (IFA), os laboratórios precisariam apenas da célula-mãe, o que facilitaria o processo no país.
“É situação de guerra, não dá para ficar amarrado na burocracia. Não existe vacina produzida disponível no mundo. Não podemos paralisar a importação, e precisamos nos preparar para produzi-las em curto espaço de tempo”, disse Fagundes ao Valor.
Na segunda-feira, representantes da Anvisa, do Ministério da Agricultura e do Sindan vão se reunião para tratar do assunto. Procurada, a Anvisa, informou que prefere esperar a reunião para se posicionar sobre a proposta.