A pandemia causada pelo novo coronavírus afetou os preços de diversos produtos e fez com que os brasilienses mudassem alguns hábitos alimentares. Muitos trocaram o consumo da carne pelo ovo, por exemplo. No entanto, até o que era alternativa ficou caro. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o preço, no atacado, do ovo de galinha grande branco teve um aumento significativo. Em dezembro de 2019, o preço de 30 dúzias estava em R$ 112,94. Em 2020, no mesmo mês, o valor subiu para R$ 125,84. Já em dezembro do ano passado, o valor chegou a R$ 146.
A alta no preço foi sentida pela boleira Juliana Gomes da Silva, 37 anos. Ela passou a produzir bolos, brigadeiros e outros doces desde o início da pandemia. Toda semana, a boleira precisa comprar 60 ovos para sua produção e percebeu o aumento. “Em outubro de 2021, eu pagava R$ 10 em uma cartela com 30 ovos. Hoje, estou encontrando por R$ 14, e pago esse valor, pois compro em atacado”, ressalta.
Com isso, os impactos no negócio são inevitáveis. Juliana afirma que não pode diminuir a quantidade de ovos utilizados, para que os produtos não percam qualidade. “Para não perder cliente, ainda não repassei esse aumento. Estou preferindo tirar do meu lucro mensal que, em média, acabou diminuindo em 10%”, aponta.
A moradora do Riacho Fundo Vanda Martins, 49, teve de mudar um pouco o cardápio em casa. Assim que a pandemia teve início, ela percebeu um aumento no preço da carne e passou a comprar mais ovos. A cozinheira conta que dobrou a quantidade do produto na lista de compras. No entanto, Vanda sentiu a diferença no preço do alimento. “Antes, eu comprava uma cartela com 30 unidades por R$ 7 ou R$ 8. Hoje em dia, o preço está batendo R$ 15”.
A reportagem do Correio foi a alguns mercados no Sudoeste e ouviu os clientes reclamarem do preço do produto. Alguns classificaram como “terrível” e disseram que não lembram a última vez que o alimento estava mais barato. A cartela com 30 unidades de ovos brancos foi encontrada por um preço médio de R$ 15,62.
Saudável
Apesar da alta nos preços, no consultório da nutricionista Camila Vieira foi notado um aumento no consumo de frangos e ovos por parte dos pacientes, devido ao preço da carne. “Eu vejo que essas opções estão mudando, por conta dos preços. Isso, querendo ou não, acaba impactando no nosso hábito alimentar”, diz.
A nutricionista concorda com a adição do ovo no cardápio e afirma que o alimento tem cerca de treze vitaminas essenciais. “Quando a gente fala que são essenciais, são substâncias que a gente não produz no corpo e que, essencialmente, a gente precisa ingerir. Ele tem muitas vitaminas, minerais, proteínas de alta qualidade e gordura insaturada que, dentro de um contexto, são gorduras saudáveis, que a gente precisa”, afirma Camila.
No entanto, a nutricionista faz um alerta. “Lembrando que tudo isso se trata do contexto alimentar daquela pessoa que ingere ovos. Tem muita gente que não come ovo. Mas, se ela se sente bem, se o ovo faz parte do hábito alimentar dela e se estiver bem distribuído dentro de um contexto equilibrado de alimentação, vai trazer muitos benefícios”, explica.
De acordo com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF), a produção de ovos caipiras no sistema semi-intensivo, que engloba pequenos e médios produtores, aumentou 15% de 2020 para 2021. No ano em que se iniciou a pandemia, foram produzidos cerca de 1,6 milhões de dúzias de ovos caipiras. Já no ano passado, os números fechados ainda não foram divulgados, mas o órgão estima que a produção possa chegar a pouco mais de 1,8 milhões de dúzias.
O zootecnista da Emater-DF Maximiliano Cardoso disse que a demanda por ovos aumentou por ele ser uma ótima fonte de proteína de qualidade de origem animal e ter um custo menor quando comparado com outras fontes como a carne bovina, aves e suínos. “Efeitos ligados à pandemia ocasionam diminuição de renda, aumentando o consumo do ovo nas casas. Além disso, muitas famílias passaram a preparar a comida nas residências, e o ovo é um alimento pronto por si só, sendo ingrediente de várias receitas de pães, bolos, massas, etc.”, destaca o especialista.
Produtores do DF também sentem alta
Dados divulgados pela Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) mostram que o Valor Bruto da Produção (VBP) de ovos no DF foi de, aproximadamente, R$ 60,9 milhões em 2019. No ano seguinte, o valor aumentou para pouco mais de R$ 61 milhões. Em 2021, contudo, houve queda no VBP, que fechou em R$ 56,7 milhões.
Essa diminuição pode estar aliada ao aumento no preço de venda do ovo aos consumidores. “Os custos de alimentação e nutrição das aves de postura representam cerca de 70% do custo total de criação. Na avicultura, é forte a presença de commodities como o milho e a soja. Esses dois ingredientes aumentaram consideravelmente nos últimos anos e respondem por cerca de 80% dos custos da ração dos animais de postura, refletindo diretamente no aumento do custo de produção e, consequentemente, no preço final”, afirma o zootecnista da Emater-DF, Maximiliano Cardoso.
No DF, existem 174 produtores de aves de postura, segundo a Emater-DF. Valdir de Oliveira, 60, é um deles. O avicultor conta que se dedica à produção de ovos há 15 anos, em uma chácara do Núcleo Rural Boa Esperança, em Ceilândia. “Comecei como hobby, pois minha mãe gostava. Ela criava 20 galinhas e, depois que ela faleceu, eu continuei cuidando das aves e acabei investindo no segmento”, conta.
Atualmente, Valdir possui 800 galinhas em sua granja, de quatro linhagens diferentes, que produzem cerca de 30 dúzias de ovos por dia. Ele afirma que sentiu o aumento no preço dos insumos utilizados para criar as galinhas, fazendo com que seu lucro mensal caísse de 50% para 30%. “Por conta disso, tive que aumentar o valor de venda. Antes, o preço de uma dúzia saia a R$ 8 no atacado. Agora, tenho que vender a R$ 10”.
Valdir também conta que o preço dos insumos fizeram muitos avicultores desistirem da produção de ovos. Foi o caso de Moacir Soares, 42, que contava com uma granja de 300 galinhas. Contudo, o alto preço dos insumos fez com que ele desistisse da produção e passasse a comprar os ovos já produzidos para revender. “Está muito caro. O que eu estava faturando quase não era o suficiente para suprir os gastos. O que eu compro de outra granja sai 50% mais barato do que aquilo que eu produzia aqui. Minha produção estava limitada a cinco caixas por semana, o que fazia com que meu lucro mensal fosse de apenas R$ 800. Por isso, estou preferindo comprar de outras granjas, que o lucro acaba sendo maior”, explica Moacir.