“Estávamos num crescimento de dois dígitos entre janeiro e abril, quando veio a notícia do caso de gripe aviária. O volume de exportações diminuiu, mas conseguimos fechar o semestre com leve alta de 0,5%”, relata Ricardo Santin da ABPA.
Terceiro maior produtor mundial de frango e principal exportador, o Brasil já está retomando o ritmo de crescimento nessas duas frentes, após atravessar um período de baixa, em maio e junho, em decorrência do anúncio de um caso de gripe aviária numa granja comercial em Montenegro (RS). “Estávamos num crescimento de dois dígitos entre janeiro e abril, quando veio a notícia do caso isolado de gripe aviária. O volume de exportações diminuiu e o crescimento no acumulado até maio desacelerou para 4,8%. Houve nova queda em junho, mas conseguimos fechar o semestre com um pequeno índice positivo de 0,5% e esperamos voltar rápido ao ritmo acelerado do começo do ano”, relata Ricardo Santin, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
Já o resultado financeiro das exportações no primeiro semestre do ano chegou a US$ 4,871 bilhões, 5% a mais do que os US$ 4,636 bilhões registrados no mesmo período de 2024. Os principais compradores foram os Emirados Árabes Unidos, a China, a Arábia Saudita e o Japão. “A expectativa é que ocorra uma evolução significativa nos níveis dos embarques neste segundo semestre, ampliando o resultado positivo esperado para este ano”, avalia Santin.
Para o presidente da ABPA, o Brasil soube agir rapidamente para evitar a expansão da doença, o que foi fundamental para conseguir o reconhecimento oficial da Organização Mundial da Saúde Animal (OMSA) como país livre da gripe aviária — o atestado da entidade foi publicado em 26 de junho, pouco mais de um mês após a detecção do problema na granja gaúcha. Vários países que haviam interrompido a importação do frango brasileiro já voltaram a fazer pedidos — dos 151 clientes internacionais do Brasil, apenas União Europeia, Albânia, Canadá, Chile, China, Macedônia do Norte, Malásia, Paquistão, Peru e Timor-Leste mantinham o embargo no início de julho.
Dos quase 15 milhões de toneladas de frango produzidos em 2024 pelo Brasil, 5,3 milhões foram destinados à exportação — uma fatia de 35% que vem crescendo nos últimos anos e deve continuar avançando. A liderança nas vendas ao exterior é disputada pela Seara, do grupo JBS, e pela BRF, que está em processo final de fusão com a Marfrig e resultará na marca MBRF Global Foods Company — o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) ainda analisava, no início de julho, um recurso do frigorífico Minerva contra a fusão.
Não há dúvida, porém, que Seara e BRF sejam as maiores exportadoras globais de frango, com a americana Tyson Foods em terceiro no ranking. Na Seara, os negócios internacionais já respondem por 55% da receita. Na BRF, as exportações cresceram 25% nos últimos dois anos. Ambas intensificam os esforços de expansão na Ásia, incluindo o mercado halal, dos países islâmicos.
O Brasil não é líder em exportação à toa, observa o presidente da ABPA. “Nossos produtores seguem as normas sanitárias rigorosamente, porque sabem que elas são fundamentais na concretização dos negócios. De todo modo, ninguém está livre da ocorrência da doença, já que ela geralmente é transmitida por aves migratórias”, explica.
Para preservar a saúde das galinhas e pintainhos, os produtores brasileiros costumam evitar árvores frutíferas ao redor das granjas (para não atrair pássaros), dão preferência ao abastecimento de poços artesianos (as águas abertas de lagos e açudes estão mais sujeitas ao contato com vírus e bactérias) e usam desinfetantes para afastar a possibilidade de contaminação na entrada de pessoas e veículos. “Mesmo assim, é impossível eliminar o risco de surgir um caso ou outro. E isso vale para qualquer país”, diz Santin.
Aliás, comparado com outros países que já registraram a gripe aviária, o Brasil foi exemplar na contenção do caso isolado da doença em Montenegro. Com a rápida ação do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), as 17 mil aves da granja atingida pela doença foram abatidas, as demais avícolas da região foram visitadas uma a uma e periciadas e até veículos que cruzavam o município passaram por desinfecção.
“Nos Estados Unidos, onde a gripe aviária escapou ao controle, cerca de 170 milhões de aves tiveram de ser abatidas nos últimos três anos”, observa Santin.
Além desse descarte em massa de aves, a crise na produção avícola americana levou ao desabastecimento de carne de frango e ovos e à transmissão da gripe a rebanhos bovinos e até a humanos – no país, cerca de 70 pessoas foram infectadas e uma delas morreu.
As exportações de ovos brasileiros para os Estados Unidos chegaram a crescer 816% no primeiro quadrimestre de 2025. Com isso, o Brasil, que historicamente exporta poucos ovos, cerca de 1% do que produz, mais que dobrou as vendas externas nesses quatro meses.
Já no mercado interno, a produção de ovos tem crescido consistentemente e o consumo per capita dos brasileiros, que subiu de 252 ovos em 2023 para 269 em 2024, segue em alta — para atender esse apetite, o país já se tornou o quinto maior produtor mundial.
O aumento de preços acima do esperado nos primeiros meses do ano, inflando o índice de inflação, não reduziu o consumo. Segundo os produtores, o salto nos preços se deveu a uma alta além da conta nos insumos, combinado com as súbitas ondas de calor no período — que reduziram o desempenho das poedeiras — e a um fator sazonal, a tradicional demanda 20% a 30% maior durante a quaresma. O crescimento nas exportações de ovos também ajudou no aumento de preços, mas pouco.
“O consumo de ovo está aumentando no mundo todo, porque ele deixou de ser visto apenas como proteína acessível para ser reconhecido como alimento nutricionalmente completo, saudável e versátil”, afirma Márcio Utusch, presidente da Mantiqueira, maior produtora de ovos do país. No ano passado o Brasil produziu 57,7 bilhões de unidades — o que dá uma média de 1,8 mil por segundo — e pode ultrapassar os 60 bilhões neste ano. A Mantiqueira, pelo menos, espera crescimento acima de 10% sobre os quatro bilhões de ovos que produziu em 2024.
Na produção de ovos a diversificação de produtos se resume às formas como as poedeiras são criadas — se vivem em espaços abertos ou não, se dispõem de rações melhores ou não. No caso do frango, porém, os cortes são cada vez mais específicos para atender às preferências de cada mercado e surgem novos produtos a cada ano. A BRF, por exemplo, conseguiu ampliar consideravelmente os embarques para a China de pés de frango, iguaria subestimada na maioria dos países.
Os chineses — que também são grandes produtores avícolas, mas não a ponto de abastecer o país inteiro — também compram muita asa de frango, enquanto europeus e americanos preferem a carne magra do peito, africanos e asiáticos são fãs de coxa e sobrecoxa, japoneses exigem coxas desossadas e países do Oriente Médio e América Latina adoram os miúdos. Nos países islâmicos, todas as partes de frango são apreciadas, desde que resultem de abates conduzidos por muçulmanos e precedidos por uma prece.
A Seara anunciou que fará 150 lançamentos em escala global, dos quais 90 direcionados ao mercado interno. Uma das principais apostas da companhia são os petiscos fáceis de ser preparados , o chamado “snacking time”. Na avaliação da Seara, com a volta ao trabalho presencial há uma busca por refeições mais práticas dentro do lar, usando muito a Airfryer. “Queremos ser protagonistas em cada momento de consumo, oferecendo produtos que combinem conveniência, prazer e inovação. Estamos preparados para liderar essa nova fase da alimentação no Brasil e no mundo”, afirma João Campos, CEO da companhia.