Por Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico Agro Sustentável
Estamos começando a safra de um modo bem assertivo. Neste momento, o horizonte tranquiliza as expectativas e, além disso, o campo está motivado pelo sucesso da safra 2022/2023, cujo resultado alcançou 317 milhões de toneladas de grãos, segundo a Conab. Um crescimento de 16,5% sobre o período anterior, algo em torno de 45 milhões de toneladas a mais. A maior colheita histórica de grãos. Até meados da safra, a expectativa era menor, por conta de obstáculos climáticos de seca ou chuva fora da medida certa. Mas o marcante desempenho da safrinha em produtividade e, também, o forte crescimento do trigo fecharam a colheita em ritmo ascendente e isso sempre contagia o plantio seguinte.
Na frente externa, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos reduziu as previsões para a safra norte-americana de 410 para 405 milhões de toneladas (com estoques de 120 milhões de t), o que mantém os preços olhando para cima. Há também um viés de alta para os preços dos grãos devido à guerra da Ucrânia, primeiro pela saída formal da Rússia do acordo negociado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para a exportação de grãos ucranianos através do Mar Negro, o que traz novo potencial de risco para o comércio mundial de alimentos. Fora isso, há um crescente sentimento internacional de que o fim desse conflito pode não estar tão perto, mas sim distanciando-se cada vez mais.
Também no campo externo houve uma mudança de tom dos europeus em relação ao acordo com o Mercosul, o qual haviam condicionado a novas exigências ambientais e participação em compras governamentais. Com a reação brasileira demandando revisão nessas exigências, a União Europeia emitiu acenos positivos para se assinar o acordo até o final do ano. “Para nós, o acordo é muito mais importante do que as compras públicas e pequenos detalhes que podem se fechar ao final da negociação”, disse o embaixador do bloco europeu no Brasil, Ignácio Ibañez, no final de julho. Isso é positivo, pois o tratado prevê redução gradual de tarifas comerciais por 15 anos, o que mais adiante deve beneficiar o agro no mercado consumidor europeu.
No ambiente interno o Plano Safra aparentemente saiu calibrado para a expansão das colheitas e, de um modo geral, foi bem recebido pelo campo, em que pesem questões históricas que precisarão de mais ênfase com o correr do tempo, como armazenagem e seguro rural. Aliás, a chegada de mais um Plano Safra já é, em si, um motivo de confiança: é algo que quase sempre escapa à nossa atenção, mas este é o 33.o plano safra consecutivo do Brasil. Ou seja, há mais de três décadas o Plano Safra bate o ponto na porteira das fazendas, mostrando a consistência histórica de um dos pilares da governança estratégica do setor. Visão de longo prazo somada a perseverança, aprendizado, tempero de ousadia e, sobretudo, continuidade evolutiva.
O Plano Safra 2023/2024 também acolheu as demandas ambientais e climáticas ao criar estímulos às boas práticas sustentáveis por meio de bônus nos juros. Com isso, o plano entra no espírito do nosso tempo: alinha-se a demandas que hoje são crescentes em sociedades que representam mais de 70% do PIB mundial e buscam avançar na agenda da sustentabilidade e em metas de transição para uma economia verde. Para um país como o Brasil, que exporta alimentos para cerca de 200 países e alimenta algo ao redor de 800 milhões de pessoas, isso também significa compartilhar os valores do cliente, o que é fundamento essencial para se construir confiança e relevância no relacionamento comercial.
Boa safra!