O frio intenso registrado nos Estados Unidos nos últimos dias acentuou o quadro de aperto na oferta dos principais produtos agrícolas do país. Ainda não há cálculos precisos sobre as perdas que as baixíssimas temperaturas causarão diretamente às lavouras, mas os danos não se restringem às plantações: toda a cadeia agropecuária americana, da oferta de energia aos canais de escoamento da produção, tem sido afetada. O clima adverso tem tido reflexos em particular sobre o trigo, uma leitura que se refletiu nas negociações do cereal na bolsa de Chicago.
Os produtores de trigo do país trabalham no momento na safra de inverno, que depende de baixas temperaturas para o bom desenvolvimento das plantas. Coberturas uniformes de neve são igualmente desejáveis. No entanto, existe o receio de que parte das lavouras se perca se a neve se acumular por mais tempo do que o normal.
Foi essa leitura, em parte, que fez os contratos de trigo negociados na bolsa de Chicago subirem quase 4% na terça-feira. Ontem, em um ajuste após a disparada ocorrida na véspera, os lotes futuros do cereal com entrega para maio recuaram 2,04% (13,5 centavos de dólar), para US$ 6,48 o bushel.
Em algumas regiões dos EUA, as temperaturas ficaram abaixo de -20ºC nos últimos dias, e a neve cobriu mais de 70% do território do país. Houve fortes nevascas no Texas, de onde sai boa parte do trigo que o país exporta. A neve fechou ferrovias, e também houve restrições para navegação no rio Illinois, um dos principais canais hidroviários de escoamento da produção agrícola americana. Muitas cargas de grãos não têm chegado aos portos do Pacífico.
Empresas como Cargill, ADM e Tyson Foods reportaram redução nas jornadas dos trabalhadores para poupar energia e custos e, assim, tentar melhorar a produtividade. De acordo com a Dow Jones Newswires, a forte onda de frio causou um pico de uso de energia no Texas, e os operadores do sistema foram obrigados a desligá-lo. Milhões de texanos ficaram sem energia na manhã desta quarta.
Segundo a empresa americana de meteorologia DTN, as condições de inverno extremo nos EUA deverão continuar nos próximos dias. O frio intenso também tem causado problemas para as cadeias de produção de carne, leite e grãos, o que amplifica o quadro de aperto da oferta – a China intensificou suas compras de soja e milho produzidos nos EUA nos últimos meses.
Foi no trigo, no entanto, que, em seu relatório mais recente sobre oferta e demanda de commodities agrícolas, o USDA, o Departamento de Agricultura do país, mais reforçou sua estimativa de aperto da oferta global. O cálculo foi divulgado no dia 9, antes do início das ondas de baixas temperaturas.
O USDA aumentou em quase 1 milhão de toneladas sua projeção para o consumo global de trigo, que passou a ser de 769,3 milhões de toneladas para a safra 2020/21. Agora, a estimativa é que os estoques finais na temporada fiquem em 304,22 milhões de toneladas, quase 9 milhões de toneladas a menos que o previsto apenas um mês antes.