Quase um mês depois de sacramentar o chamado vazio sanitário – 28 dias sem novos focos em granjas comerciais – o Ministério da Agricultura enviou à Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) a documentação que embasa a autodeclaração de país livre da gripe aviária. A medida encerra o curto (mas caro) bloqueio sanitário que reduziu drasticamente as vendas externas do maior exportador de frango do planeta. A autodeclaração brasileira é a peça que faltava para recolocar o frango nacional na rota do comércio mundial, mas o jogo só termina quando importadores, um a um, tirarem o país da “ban list” (lista de proibições).
1 – Restrições tendem a cair gradualmente, não de uma vez
O selo internacional da OMSA deve sair em alguns dias, segundo o setor. Mas ele não reabre, por decreto, mercados fechados às pressas em maio.
Cada um dos mais de 40 mercados que impuseram restrições (incluindo 20 países com proibição total e os 27 da União Europeia) terá de revisar acordos sanitários, processo que deve ocorrer em ondas, começando pelos parceiros que já vinham adotando embargos regionais, como Japão, Arábia Saudita e Emirados Árabes.
Por que isso é importante: sem o aval formal da OMSA e a revalidação dos protocolos bilaterais, frigoríficos não conseguem embarcar mercadoria e tampouco contratar seguro-carga internacional.
2 – Como fica o comércio global de proteína animal
O Brasil responde por mais de um terço do comércio mundial de carne de frango e exporta cerca de 35% de tudo o que produz. Num mercado em que o consumidor global migra para proteínas mais baratas, deixar o país fora de jogo pressiona preços em toda a cadeia nos quatro cantos do globo.
Para 2025, o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) projetava que dois terços do crescimento das exportações mundiais viriam justamente do Brasil. A interrupção obrigou importadores a buscar fornecedores alternativos — Argentina, Tailândia, Estados Unidos — pagando prêmios que corroeram margens de varejistas e redes de “food service”.
3 – O que acontece agora para megaexportadoras como JBS e BRF
Empresas como JBS e BRF voltam a vislumbrar recomposição de volumes de vendas no exterior e recuperação futura de contratos que migraram temporariamente para concorrentes.
O surto reforçou a necessidade de protocolos de biossegurança mais rígidos e caros — despesa que veio para ficar.
4 – Impacto para investidores do setor
O reingresso pleno das empresas brasileiras nos mercados depende do tempo de resposta de China e União Europeia, que juntas compram quase 30% do frango brasileiro. Enquanto isso, a volatilidade nas ações tende a persistir, segundo analistas.
5 – O que o governo pode fazer agora
Depois do surgimento do foco em Montenegro (RS), as autoridades brasileiras agiram em duas frentes: cumpriram os protocolos sanitários para evitar o surgimento de novos focos aqui no Brasil enquanto negociavam com os principais clientes a regionalização de embargos: se um novo foco surgisse, o bloqueio ficaria restrito ao raio de quarentena, não ao país inteiro. A partir de agora, é hora de gestão política do Ministério da Agricultura junto a parceiros internacionais para normalizar as exportações de frango do país.
6 – Efeito na inflação e nos supermercados
Com o Brasil de volta ao tabuleiro, analistas esperam alívio nos preços globais do frango a partir do terceiro trimestre. Para o IPCA (principal índice de inflação do país), qualquer recuo no atacado costuma chegar às gôndolas de 60 a 90 dias – variável chave num ano de taxa Selic ainda alta e renda comprimida.