A Receita Federal incluiu o setor agropecuário no Programa Nacional de Conformidade Tributária e vai iniciar ações de fiscalização na atividade rural a partir de setembro. O foco será nas receitas e despesas dos produtores rurais pessoas físicas, com o cruzamento de dados das declarações de imposto de renda e do livro caixa digital, além de verificações nas operações de arrendamento e parcerias no campo.
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e as federações estaduais têm alertado os produtores sobre essa fiscalização tributária e a possibilidade de recebimento de notificações ou autuações.
O Fisco vai averiguar a tributação das receitas e a dedução das despesas relativas à atividade rural na apuração do resultado fiscal dos produtores. Quem tiver inconformidades detectadas vai receber carta física ou correspondência eletrônica no sistema do contribuinte do órgão solicitando a avaliação e retificação das informações para regularização das pendências sem multas em 60 dias.
Caso o contribuinte não entregue ou retifique as pendências, a Receita poderá aplicar multa qualificada que pode chegar a 225%, informou a CNA, e abrir o processo de fiscalização, com restrições cadastrais.
Segundo a CNA, cerca de 98% dos produtores rurais brasileiros são pessoas físicas. “O foco vai ser a receita não declarada e a despesa declarada que não tem relação com atividade rural”, afirma Renato Conchon, chefe do Núcleo Econômico da CNA. “São situações em que o produtor rural não declarou ou declarou errado na venda dos seus produtos ou colocou gastos de fora da produção como se fosse da atividade rural para reduzir lucro e pagar menos imposto”, completa.
O livro caixa digital é exigido desde 2020 para produtores com faturamento anual a partir de R$ 4,8 milhões, mas muitos não se adequaram, diz Conchon. A Receita também deverá avaliar os contratos agrários, como os de arrendamento de terras ou de parcerias, que têm tributações diferentes.
Esse é um ponto de atenção, avalia o advogado tributarista, Fábio Calcini. Segundo ele, muitos produtores optam pela formalização de contratos de parceria, que tem tributação menor, de 5,5% sobre a receita líquida, enquanto os acordos de arrendamento utilizam a alíquota progressiva, que pode chegar a 27,5%. Ele observa que essa verificação dependerá da interpretação da Receita Federal sobre as características da relação estabelecida.
“É dever da Receita fiscalizar os contribuintes, e os produtores não são imunes a isso, mas o que nos preocupa é o alarde que começa. O contribuinte tem medo, começa a ficar preocupado. O momento é de calma”, afirma.
De acordo com Fábio Calcini, a intenção do Fisco é eliminar a sonegação e regularizar quem errou, mas ele aponta outros propósitos, como a necessidade de arrecadação tributária em um setor que ganhou força econômica nos últimos anos.
Em apresentação feita a entidades do setor produtivo, a Receita enfatizou que o objetivo da ação é estimular a autorregularização, orientar para o correto cumprimento das obrigações tributárias e fiscalizar casos de fraudes. Produtores podem consultar se possuem alguma irregularidade no portal e-CAC.
A Receita já iniciou a ação com projetos pilotos em Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul, São Paulo e Santa Catarina, e soma 53.689 autorregularizações nos cinco Estados, disse a CNA.
O órgão garantiu ao setor que não haverá aplicação de multas de ofício. Em caso de inconformidade, os tributos devidos poderão ser pagos de forma parcelada. Procurada, a Receita não respondeu ao pedido de entrevista.