A FACTA promoveu, na semana passada, o Simpósio Nordestino de Produção, Processamento e Comercialização de Ovos em Recife (PE). Totalmente presencial, ao longo de três dias e com encerramento nesta sexta-feira (25), foram analisados o panorama da produção e abastecimento, legislação, sanidade, nutrição, sistemas produtivos, custos e industrialização de ovos.
A mestre e doutora em Medicina veterinária preventiva, Presidente COESA-MG e membro do Corpo técnico da FACTA, Josiane Tavares de Abreu abordou o tema da biosseguridade na prática.
Segundo ela, a biosseguridade contempla, entre outros pontos além de isolamento, controle de trânsito e higienização, constituindo na verdade um programa de gerenciamento de riscos, constituído de outros pontos fundamentais para a implementação e a manutenção de um programa de biosseguridade, como os itens de quarentena, medicação e vacinação; monitoramento, registro e comunicação dos resultados; programa de erradicação de doenças; processos de auditorias e atualização constante do programa; programa de educação continuada da equipe e a criação de um plano de contingência.
“Inseridos nesses elos encontram-se o cuidado com a qualidade do material genético recebido, a qualidade da cama de aviário, a qualidade da água e a manutenção dessa qualidade até chegar as aves, a qualidade das matérias-primas na fábrica de ração, do controle necessário para evitar a contaminação entre diferentes fontes, produtos acabados e matérias-primas, da capacidade de realizar all in all out, aplicação dos conceitos de ‘área limpa’ e ‘área suja’ e respeitando sempre o fluxo de pessoas, veículos e equipamentos da área limpa para a área suja, do tempo de vazio sanitário entre lotes, o controle de pragas e manejo adequado dos resíduos gerados na unidade produtiva, dentre outros pontos”, elencou.
De acordo com Josiane, a prevenção de enfermidades em um sistema de produção avícola depende de um programa de biosseguridade de amplo espectro, operacionalizado dentro de uma sequência de planejamento, implementação e controle e auditoria. “Todo programa de biosseguridade deve sempre se basear na realidade epidemiológica e nos prováveis desafios que venham a acontecer. O processo se inicia primeiro mapeando os riscos da região e da empresa, de posse desse mapeamento, se já existem no programa atual de biosseguridade, se precisam ser revisados e melhorados, quem fará essa revisão e o treinamento da equipe e quem auditará os processos”, pontou. “E, após auditagem, se os pontos levantados como não conformes serão analisados, revisados, implementados e como saber que funcionou”, disse. “Ou seja, é um processo contínuo de melhorias e ajustes e precisam de profissionais qualificados e com tempo para realizar essa tarefa”, explicou.
Nutrição de precisão para galinhas de poedeiras
Outro destaque do Simpósio Nordestino de Produção, Processamento e Comercialização de Ovos foi o debate promovido pelo professor do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal da Paraíba, Fernando Guilherme Perazzo Costa,
Segundo ele, a nutrição de precisão baseia-se na premissa de atendimento das demandas nutricionais em cada fase da vida das aves, ou seja, com a evolução tanto das galinhas quanto dos ovos, a reavaliação da dieta pode propiciar maior balanceamento das mesmas e assim, maior e melhor utilização pelo animal. “Com os avanços genéticos na produção de aves, as necessidades nutricionais tendem a se especificarem cada vez mais. Diversos fatores estão relacionados com a qualidade da ração fornecida às aves, dentre eles, os próprios ingredientes utilizados nas formulações, o processo de inclusão e mistura dos mesmos, a forma de armazenamento e a distribuição das rações, e esses processos podem ser melhorados com a adoção de boas práticas de fabricação”, ressaltou.
A boa formação da poedeira nas fases de cria e recria através de programas nutricionais e manejo adequado é essencial, segundo Perazzo, para um adequado retorno econômico na fase de produção, constituindo uma ferramenta importante para a garantia de elevados níveis de produção. “Na avicultura, o conceito de zootecnia de precisão vem sendo utilizado, uma vez que, os custos com alimentação são responsáveis por grande parte do custo da produção de aves”, destacou. “Ela permite o fornecimento de uma ração balanceada, utilizado os conhecimentos das necessidades nutricionais aliada ao conhecimento do valor nutritivo dos alimentos, resultando em uma ração com um custo baixo e um máximo desempenho dos animais, diminuindo assim o desperdício de nutrientes”, explicou.
“Portanto, a implementação de tecnologias que desenvolvam melhorias à produção animal em conjunto com a minimização dos custos de produção torna-se desejável, sendo a nutrição de precisão uma técnica viável para a junção desses dois fatores principais”, avaliou.
Utilização de aditivos permitidos na alimentação das aves com objetivo de minimizar o uso de antibiótico
O professor da Escola de Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Goiás José Henrique Stringhini trouxe o tema da utilização de aditivos em dietas de aves. Ele discutiu aspectos quanto ao uso de aditivos em dietas de poedeiras e, principalmente, pontuou a saúde intestinal como um aspecto básico para que a inclusão de aditivos na dieta promova a saúde das aves e que consolide o bom desempenho esperado para as linhagens modernas de poedeiras comerciais.
Ele explicou que essa prática tem sido um desafio importante nos últimos anos, especialmente desde 2006, com o banimento do uso de antibióticos promovido pela União Europeia. “Além disso, as mudanças no uso terapêutico com antibióticos na Comunidade Europeia ainda têm atualizações com a orientação do tratamento individual dos rebanhos em detrimento do individual, como proposto em 2022”, afirmou.
Esses fatos trazem a luz, de acordo com sua explicação, a diferentes recomendações na busca por alternativas de aditivos alimentares, incluindo pesquisas e trabalhos de campo que suportam essa tomada de decisão. “Porém, comparado ao mercado de frangos de corte, o volume de informações ainda é pequeno frente a necessidade e desafios que o setor enfrenta, mas a base de conhecimento acumulado é bastante importante para permitir a utilização de forma técnica e assertiva”, avaliou.
Uso de enzimas e efeitos no desempenho e saúde intestinal de galinhas poedeiras comerciais
Na criação de galinhas poedeiras industriais os custos com a alimentação são onerosos representando cerca de 75% do custo total da produção, e aproximadamente 85% desse total é representado pelas fontes de proteína e energia. O que justifica também a inclusão das enzimas nas rações como uma alternativa visando a redução do custo relacionado com a alimentação.
De acordo com Stringhini, as enzimas são adicionadas às dietas das aves de modo geral, visam diminuir os efeitos dos fatores antinutricionais presentes nos ingredientes que as compõem. As enzimas utilizadas apresentam função nutricional de forma indireta, isso quer dizer que esse aditivo auxilia no processo digestivo melhorando a eficiência de digestibilidade de determinados componentes químicos dos ingredientes das rações.
Ingredientes de origem vegetal, de acordo com Stringhini, apresentam compostos que não são digeridos pelas enzimas endógenas das aves, que se constituem em fatores antinutricionais, sendo que a suplementação com enzimas em rações permite a liberação de nutrientes como nitrogênio e fósforo. “Com isso, reduzem consideravelmente a excreção desses nutrientes complexados no meio ambiente, e maximizam o uso nutrientes pelas aves”, afirmou.
De acordo com ele, os frangos de corte e poedeiras sintetizam enzimas em quantidades insuficientes não conferindo grande participação no processo de digestão, havendo a necessidade de inclusão de enzimas exógenas para reduzir os efeitos dos fatores antinutricionais dos ingredientes da ração como os inibidores de tripsina e o ácido fítico. “As enzimas apresentam distintos mecanismos de atuação diante de diferentes substratos, tanto na forma isolada como em complexos enzimáticos que podem ser eficazes na liberação de múltiplos nutrientes da dieta. Por conta da atuação das enzimas exógenas na liberação de nutrientes antes indisponíveis para o animal, é possível ajustar a inclusão de muitos ingredientes colaborando na redução final dos custos”, detalhou.
Probióticos, prebióticos e simbióticos como aditivos alternativos
O uso de probióticos nas dietas avícolas vem crescendo, pois não resulta no desenvolvimento de bactérias patogênicas resistentes, se constituindo em alternativa para substituir a utilização de antibióticos nas dietas. “A utilização de probióticos em dietas com alta energia e alta densidade de nutrientes acarreta em melhor digestibilidade, equilíbrio intestinal e melhora o desempenho de poedeiras”, afirmou Stringhini.
“Por sua vez, os prebióticos são definidos como ingredientes alimentares não digestíveis e utilizados por bactérias benéficas no trato gastrointestinal, contribuindo para melhorar a saúde intestinal do hospedeiro”, detalhou. “Além disso, prebióticos podem atuar como barreira para proliferação de patógenos transmitidos por alimentos, como Campylobacter e Salmonella. Com base nessas características, os prebióticos podem atuar como substitutos aos antibióticos nas dietas das aves”, detalhou.
Já os simbióticos são produtos que combinam cepas bacterianas probióticas com compostos prebióticos. “Em estudos realizados com simbiótico em que se avaliou o perfil da microbiota intestinal em poedeiras com e sem desafio com Salmonella, foi evidenciado que o uso do simbiótico contendo quatro cepas probióticas Lactobacillus reuteri, Enterococcus faecium, Bifidobacterium animalis e Pediococcus acidilactici e um prebiótico frutooligossacarídeo protege contra a infecção por Salmonella enteritidis”, afirmou Stringhini.
“Nunca se deve desvincular a utilização de aditivos com outras técnicas que permitam a utilização de ingredientes de qualidade, sem comprometer a composição e a contaminação das dietas, e associar as técnicas de biosseguridade, higiene e desinfecção, além da aplicação de vacinas e medicamentos com assessoria técnica de profissionais da área”, afirmou Stringhini.
Uso racional de antimicrobianos
O professor do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais, Oliveiro Caetano de Freitas Neto, trouxe o debate sobre o uso racional de antimicrobianos. Segundo ele, a produção de alimentos de origem animal é parte importante da economia dos países e primordial para a nutrição das populações. “No entanto, esse tipo de atividade exige muita responsabilidade dos produtores e profissionais envolvidos. É preciso que os sistemas de produção animal respeitem as normas de bem-estar, não comprometam o meio ambiente e, ainda, que o alimento gerado apresente qualidade nutricional e não ofereça risco à saúde das pessoas”, afirmou.
Neto contou que os antimicrobianos são recursos indispensáveis para tratar infecções em humanos e animais, contribuindo para a saúde e bem-estar dos indivíduos. “No entanto, nos últimos anos, tem sido observado aumento na ocorrência global de resistência aos antimicrobianos (AMR) em microrganismos de diversos gêneros. Essa alteração biológica ocorre naturalmente, geralmente por meio de mudanças genéticas. Todavia, o uso indevido e excessivo de antimicrobianos tem acelerado esse processo”, explicou. “Bactérias resistentes são encontradas em pessoas, animais, alimentos e no meio ambiente (água, solo e ar), podendo desencadear infecções graves e de difícil tratamento e diante do cenário atual de AMR no mundo e das ações globais de enfrentamento deste problema, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) anunciou o projeto ‘Trabalhando Juntos Para Combater a Resistência aos Antimicrobianos’, financiado pela União Europeia (UE)”, disse. “O projeto é liderado pela representação regional da OPAS em colaboração com as representações regionais da FAO e OMSA (antes denominada ‘OIE’), com apoio da equipe de instrumentos de política externa da UE em Brasília e das Direções Gerais da Saúde e da Segurança dos Alimentos (SANTE) e de Investigação e Inovação (RTD), da Comissão Europeia”, afirmou.
Neto disse ainda que, do ponto de vista clínico, os antimicrobianos são extremamente importantes para a manutenção da saúde e bem-estar animal e humana seu acesso deve ser garantido. “Entretanto, o seu uso inadequado representa risco para a Saúde Única. Os médicos veterinários desempenham um papel fundamental para assegurar a utilização responsável e prudente desses recursos e devem entender a importância de seguir as recomendações de prevenção à AMR e a promoção do uso racional de antimicrobianos em animais, visando preservar a eficácia desses medicamentos essenciais para o futuro”, explicou.