Todos os anos, aves limícolas como o maçarico Hudsoniano e o Whimbrel viajam do Alasca até o extremo sul do Chile na América do Sul, parando em diferentes países latino-americanos ao longo do caminho. A migração dessas espécies ajuda a manter os ecossistemas marinhos costeiros ao longo da rota em equilíbrio ecológico, garantindo a presença de vermes, pequenos crustáceos e outras microfaunas que vivem abaixo do solo e são a base da alimentação das aves limícolas. Se o solo é saudável, isso é uma boa notícia para o ser humano, que pode desenvolver atividades produtivas benéficas à sua sustentabilidade.
Mas este ano, os cientistas que trabalham com esse grupo de aves migratórias estão preocupados. Estima-se que 40 milhões de aves ou mais foram infectadas pela gripe aviária A altamente patogênica nos EUA – principalmente galinhas, frangos, patos e gansos – um número mais de 10 vezes maior do que o registrado anteriormente. Se aves limícolas migratórias contraem gripe aviária no início de sua jornada no Alasca, a doença pode dizimar sua própria população, sem mencionar as populações de outras aves ao longo do caminho.
As aves costeiras são uma das espécies de aves mais vulneráveis – a perda de habitat já reduziu suas taxas populacionais. De acordo com a North American Bird Conservation Initiative (NABCI, literalmente, Iniciativa Norte-Americana pela Conservação das Aves), das 49 espécies de aves marinhas migratórias atualmente identificadas, 25 apresentam declínios sustentáveis ao longo do tempo. Algumas espécies, como a rola do mar e o maçarico-rasteirinho, perderam até 80% de sua densidade populacional desde 1974.
Evidência de gripe aviária observada no México
Agora que a temporada de migração está em andamento, a gripe aviária pode colocar essas aves em maior risco. “O mais provável”, segundo Medardo Cruz, biólogo e pesquisador mexicano, é que “o vírus chegue ao sul”.
Ele encontrou uma possível prova disso na região de Ceuta, ao sul de Sinaloa, no México, uma pequena área povoada na costa do Pacífico, onde já foram detectados vários casos de aves aquáticas e limícolas infectadas. “Encontramos um número maior do que o normal de indivíduos mortos da andorinha-do-mar”, diz Cruz. A andorinha-do-mar é uma pequena ave marinha que se reproduz na América do Norte e do Sul. “Vimos alguns espécies de tarambola nevado que apresentavam sintomas coincidentes com os da gripe aviária”, acrescentou, referindo-se a um
pássaro pequeno e gordo com uma grande cabeça.
As taxas de infecção podem aumentar
As aves marinhas migratórias têm hábitos comunais. Eles comem, descansam e até migram em grandes grupos de diferentes espécies de aves limícolas e aquáticas. Esses hábitos tornam a propagação da doença mais provável quando há um surto. E cientistas como Cruz estão com medo porque, uma vez que os pesquisadores detectam um surto, isso provavelmente significa que o número real de aves infectadas é ainda maior.
Nos EUA e no Canadá, a maioria dos institutos de pesquisa tem procedimentos para lidar com essas situações, “sabem o que fazer assim que aparecem os primeiros sinais de infecções”, disse Cruz. Na América Latina, a conservação de aves limícolas é esforço incipiente, devido à falta de laboratórios, baixo financiamento e cultura de pouco apoio à pesquisa.
Assim, pesquisadores e grupos de conservação na América Latina estão tentando divulgar agora quais precauções devem ser tomadas.
O que fazer agora para proteger as aves costeiras
Por enquanto, a gripe aviária ainda não se espalhou para a América Latina em taxas alarmantes. Ainda assim, surtos em aves continentais, como falcões, águias e corvos, levantaram preocupações na comunidade científica de que as aves costeiras podem ser as próximas. Esta é a primeira vez desde 2016 que tantas espécies não tipicamente associadas à cepa H5N1 de alta patogenicidade foram por ela afetadas.
Estudiosos de ornitologia de Cornell sugerem que qualquer pessoa que trabalhe com aves deve seguir os protocolos de biossegurança ao entrar em contato com outras aves, tomando cuidado extra para mantê-las isoladas do contato com outras populações de aves selvagens. O USDA também recomenda que se removam comedouros e bebedouros de pássaros, pois eles podem se tornar uma fonte de infecção para outras espécies.
“Temos que ter muito cuidado, especialmente agora que temos conhecimento desses surtos. Se na hora de manuseá-los você não seguir os passos adequados, então você também pode se tornar parte do problema”, aconselha Cruz.
Cruz diz que a pandemia do COVID-19 os ensinou, como cientistas, a estar em alerta máximo ao menor indício de um surto de qualquer doença que coloque em risco a sobrevivência da vida selvagem e das populações humanas. Como eles não experimentaram um surto de gripe aviária em aves limícolas antes, diz ele, “não temos certeza se existem protocolos específicos”. Mas Cruz está em contato com seus colegas americanos para estar o mais preparado possível – “pronto”, diz ele, para qualquer situação.