Risco de contaminação entre humanos é baixo, mas autoridades sanitárias trabalham com a possibilidade de o cenário mudar; laboratórios preparam vacinas
O surto atual de gripe aviária causado pelo vírus H5N1 matou um número recorde de animais. Para se ter uma ideia, de acordo com a Organização Mundial para Saúde Animal, estima-se que desde outubro de 2021 tenham sido detectados 42 milhões de casos de infecção em aves. Desse montante, 15 milhões de aves domésticas morreram em decorrência da doença. Trata-se, portanto, de um dos piores surtos já registrados desde que o vírus foi identificado pela primeira vez.
Em humanos, os casos ainda são raros. Mas o desenvolvimento de vacinas é uma preocupação global. Especialistas alertam que o vírus H5N1 pode sofrer mutações e se tornar mais adaptado para infectar humanos.
As farmacêuticas Glaxo Smith Kline (GSK) e CSL Seqirus estão entre as empresas que trabalham com imunizantes. Milhões de doses de vacinas contra a gripe aviária podem ser produzidas em poucos meses, caso uma nova cepa da doença se alastre entre humanos. Em comunicado oficial feito em março, a GSK afirmou que “em 2022 assinou contratos com os EUA, Canadá, União Europeia e Organização Mundial da Saúde (OMS) para fornecer a vacina no caso de uma pandemia de gripe declarada pela OMS. Isso garantirá a pronta produção e fornecimento do imunizante.”
A doença
Os primeiros registros do vírus H5N1 em humanos são de 1997. A doença é classificada atualmente como “preocupante” pela OMS. Quase todos os casos de infecção pelo vírus em pessoas foram associados a contato próximo com aves infectadas, vivas ou mortas, ou ambientes contaminados pela cepa. Os sintomas incluem febre, dor de cabeça, tosse, dor muscular e respiratória, podendo causar pneumonia, e falência múltipla de órgãos.
Nos últimos meses, dois fatores chamaram a atenção das autoridades em saúde pública. O aumento no número de mortes e abatimentos de animais doentes, incluindo em países da América Latina próximos ao Brasil, foi um deles. Mais recentemente, uma análise feita pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC), de amostra do H5N1 que infectou um homem no Chile neste ano, identificou duas mutações genéticas que são sinais de adaptação a mamíferos. Trata-se do primeiro caso da doença em pessoas registrado na América Latina e no Caribe, segundo a OMS.
— Entendemos que é um passo no caminho da adaptação aos humanos e isso aumenta o risco — afirmou a virologista Anice C. Lowen, da Emory University, nos Estados Unidos, ao jornal The New York Times: — Essas mutações sozinhas provavelmente não são suficientes para produzir um vírus que se espalha facilmente entre os humanos, mas é importante observar cuidadosamente todos os casos de infecção humana e acompanhar muito de perto a evolução viral nas aves.
O paciente infectado no Chile, um homem de 53 anos, apresentou sintomas respiratórios, como tosse e dor de garganta, e foi hospitalizado quando seu estado piorou. O vírus foi detectado em aves e leões-marinhos na região onde o homem vive, mas até agora não está claro como ele foi infectado. A investigação sobre o caso continua.
— Os casos de gripe aviária em humanos ainda são escassos, mas é importante que os conhecimentos com a pandemia de Covid-19 e Influenza H1N1 sejam aplicados desde já — diz o infectologista e epidemiologista Bruno Scarpellini, da PUC-Rio.
Brasil
O Brasil até hoje não tem registro da enfermidade. A ameaça mais próxima aconteceu em março deste ano, na Argentina, quando 260 mil aves de criação morreram em um surto. Os animais, a maioria frangos, vieram a óbito por consequência da própria doença ou sacrificados pelos proprietários das granjas. Estima-se que a transmissão ocorreu por intermédio de aves migratórias.
O caso fez com que os países do Cone Sul concordassem em criar uma comissão técnica sobre o assunto. O Brasil faz parte do grupo, ao lado de Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai, além da Argentina.
História
A doença foi identificada pela primeira vez há 145 anos, na Itália, por um professor de anatomia patológica da Universidade de Turim, que na época a descreveu como “peste aviária”.
O H5N1, uma das cepas causadoras da infecção, foi detectado em 1996, na China. Ganhou destaque em 2005, quando o número de mortes de frangos foi muito alto, além de registro de casos em humanos afetados pelo contato direto com os animais.