Em maio de 2023, a confirmação de que a influenza aviária (H5N1) circulava em território nacional oficializava uma verdadeira corrida contra o tempo. A estratégia era aplicar ações de combate o quanto antes, evitando que o vírus identificado em aves silvestres se espalhasse para as produções de aves comerciais. Um ano depois, as ações preventivas ainda se mostram efetivas, com a doença sob controle nas principais regiões produtores do país, entre elas o Rio Grande do Sul.
A grande preocupação era de que a contaminação, ao se espalhar para os aviários, afetasse uma fatia de negócio extremamente relevante para a economia brasileira, que exporta bilhões em carne de frango todo os anos. Basta um caso positivo para que o status sanitário do país inteiro seja alterado, com impacto em toda a cadeia avícola.
Chefe do Departamento de Vigilância e Defesa Sanitária Animal da Secretaria Estadual da Agricultura, Rosane Collares, lembra que as ações começaram a ser planejadas em conjunto com o Ministério da Agricultura assim que os primeiros casos do vírus passaram a rondar os países vizinhos da América do Sul. Como os contágios envolviam aves silvestres migratórias, era questão tempo até que a doença adentrasse os limites do Estado.
Em 24 de maio, o primeiro caso foi detectado na lagoa Mangueira, próximo ao Uruguai, e um foco na Reserva do Taim. A partir dali, tendo em vista a alta patogenia do vírus e a relevância da produção gaúcha, os protocolos passaram a ser aplicados numa escala acima de rigor.
— O Ministério da Agricultura tinha revisado recentemente o seu plano de ação para a doença de Newcastle e influenza aviária. Para as aves migratórias ele tinha alguns pontos, mas adaptamos a questão de vigilância. Então, aqui no Rio Grande no Sul, nós utilizamos o mesmo padrão de vigilância estabelecido no plano de contingência para aves domésticas. Ou seja, utilizamos sempre um padrão mais alto para que tivéssemos a garantia de que não havia contato das aves de subsistência próximas ao local onde o vírus foi encontrado — relembra Rosane.
O plano de contingência estabelecia ações de vigilância num raio de 10 quilômetros no entorno do foco da doença. Esta margem garantiu segurança aos trabalhos. Drones para monitoramento e equipes volantes de fiscais reforçaram as investidas. Em março deste ano, uma comitiva do Reino Unido desembarcou no RS e enalteceu a atuação:
— Usaram a expressão de que foi algo “impressionante”. Treinamos muita gente nossa para enfrentar a doença e temos pessoal altamente capacitado caso ela ocorra — destaca a líder do departamento de vigilância.
Outras ações direcionadas à população, como orientações para evitar o contato com animais contaminados, foram trabalhadas pelas entidades. As campanhas ganharam força durante o veraneio e após o vírus alcançar espécies de mamíferos no litoral.
Juntos, os três Estados do sul concentram 70% da avicultura comercial brasileira. As medidas de combate ao vírus, portanto, são de total interesse para a indústria. Presidente da Associação Gaúcha de Avicultura (Asgav), José Eduardo dos Santos, destaca que o trabalho conjunto do serviço público e da iniciativa privada foi fundamental para que as medidas protetivas tivessem efeito ao longo deste um ano.
— Os acontecimentos em outros continentes nos permitiram construir uma ferramenta de proteção. No início, houve alguma resistência porque exigia investimento, toda a implementação de um regramento, de orientações e boas práticas. Mas depois o setor foi se conscientizando e conseguimos um diferencial de ação preventiva que funciona por antecipação. A entrada do vírus é inevitável, mas o setor conseguiu se proteger. Isso precisa ser permanentemente aplicado tanto na indústria quanto no produtor — diz Santos.
As notificações não alteraram a condição sanitária brasileira, mas restrições econômicas pontuais chegaram a ser sentidas no período. Em agosto, o Japão embargou as compras do Espírito Santo e de Santa Catarina após casos em aves de subsistência. Pouco tempo depois, o país asiático reviu a decisão.
A medida reaqueceu as discussões sobre a regionalização dos embargos. O setor negocia com os parceiros comerciais que, em caso de contaminação na produção comercial, as sansões sejam aplicadas a uma área restrita, e não ao território todo.
Um ano depois dos primeiros registros, não há nenhum caso confirmado da doença no Brasil. Mas não é momento de baixar a guarda. Em fevereiro deste ano, o primeiro caso mais próximo das regiões produtoras, também em aves silvestres, mas em Rio Pardo, relembrou que o vírus segue circulando.
Os cuidados, portanto, seguem. Principalmente porque a enchente expôs o Rio Grande do Sul a outros riscos e a outras doenças que preocupam além da gripe aviária.
O Rio Grande do Sul é o Estado que mais envia amostras para análise no laboratório federal que concentra as averiguações. Mais de 340 suspeitas já foram encaminhadas desde a confirmação número um. Os envios permanecem mesmo com o aeroporto de Porto Alegre fechado, com encaminhamento de amostras a partir de Santa Catarina