O aumento na projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2024 anunciado pelo Ministério da Fazenda, de 2,5% para 3,2%, anula o efeito do aumento da Selic na Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) no curto prazo. Economistas ouvidos pelo Broadcast calculam que a DBGG deve girar em torno de 79% do PIB até o fim deste ano. Já para 2025, espera-se que novos fatores adicionais reforcem a pressão sobre o endividamento, em meio a um cenário externo desfavorável e uma deterioração na política fiscal doméstica.
A projeção da DBGG depende de três variáveis principais: crescimento do PIB, taxa Selic e o resultado primário. O cálculo é de que cada 1 ponto porcentual de alta no PIB nominal reduz a dívida em 0,4 pp, valor que chega a -0,05 pp considerando o efeito total, ou seja, a soma da elevação de receitas no resultado primário. Já 1 pp de variação na Selic mantido por 12 meses tem impacto de alta de 0,4 pp na relação DBGG/PIB.
De acordo com o economista do Santander Brasil Ítalo Franca, grande parte do aumento na dívida contratada para este ano já foi concretizado, com uma elevação de 4,1 pp. “Acho que agora um efeito [alta no PIB] acaba cancelando o outro [alta da Selic]. Então, um ciclo de alta 100 pontos base para cada ponto [na Selic] acaba tendo um efeito contrabalanceado pelo PIB maior”, explicou. A expectativa do mercado é de que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central anuncie hoje o início do ciclo de aperto dos juros, com uma elevação de 0,25 pp, para 10,75% ao ano.
Já no longo prazo, a perspectiva de Selic elevada, somada ao enfraquecimento econômico, é o que tem gerado preocupação entre agentes do mercado. Franca calcula que, em 2025, haverá um aumento de 4 pp na dívida, a depender se o governo conseguir de fato entregar a meta de resultado primário.
“A projeção do PIB foi surpreendente para cima este ano, mas, para o ano que vem, como a gente também está discutindo a questão de um aumento de Selic, provavelmente veremos uma desaceleração”, avaliou Franca. Em 2025, ele chama atenção para o comportamento do câmbio e uma eventual queda no preço do petróleo, além do impacto do projeto de lei de renegociação das dívidas dos Estados e dos municípios.
O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, acredita que a dívida deve chegar a 82% do PIB em 2025 diante do crescimento menor da economia e de uma Selic média elevada, além de um déficit primário que já começa em R$ 75 bilhões. “Serão 10 pontos porcentuais a mais de dívida entre o fim de 2022 e o ano que vem, o que certamente não configura nada parecido com um ajuste fiscal”, alertou.
Vale pondera que, a partir de 2027, será preciso discutir algo além da meta de superávit, partindo para uma meta de dívida em conjunto com uma regra de resultado primário. “Chegamos em um momento em que as regras fiscais terão que ser ampliadas para evitar os vazamentos que temos visto no primário. De qualquer maneira, isso vai exigir um compromisso muito maior com o lado dos gastos, dado que o limite para alta da carga tributária já foi alcançado”, afirmou.
Já economista-chefe da ARX Investimentos e ex-diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal, Gabriel Barros, demonstra preocupação não só com a economia doméstica, mas sobretudo com o quadro internacional. “Eu estou mais negativo com o cenário externo. Existe uma desaceleração que já está no curso da economia americana e que deve ganhar atração nos próximos meses. Acho que vai ficar evidente que a gente tem uma desaceleração mais forte do que as pessoas estão imaginando”, disse.
Além do comportamento econômico dos Estados Unidos, Barros faz menção ao enfraquecimento da economia chinesa, que afeta fortemente a exportação de commodities pelo Brasil. Para 2025, ele acredita que a dívida brasileira continuará crescendo em velocidade grande devido a esses desafios, além da própria dificuldade do governo em aumentar arrecadação para fazer ajuste fiscal pelo lado das receitas.
“No próximo ano, esse cenário vai estar materializado. Isso é relevante porque o orçamento do governo está muito heroico, está muito otimista, está com um crescimento superior a 2,5% – eu acho muito forte, eu acho que vai ser muito abaixo disso. O governo vai ter menos receita do que ele está colocando na conta, seja por uma desaceleração do crescimento externo, global, seja por conta de uma desaceleração aqui no Brasil”, avaliou.
Segundo Barros, se o governo não “atacar” o gasto e não conseguir aumentar imposto diante da desaceleração do crescimento, vai acabar revisando a meta fiscal e gerando uma desancoragem da política econômica no Brasil. “É uma escolha que o governo vai ter que fazer no final desse ano, começo do ano que vem. Isso vai ficar muito óbvio e o quanto antes o governo decidir, melhor”, reforçou o economista.